BRICS redefine cenário financeiro: países buscam reduzir dependência do dólar

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Com inovações financeiras que ganham escala internacional, os países do bloco indicam caminhos para a integração monetária latino-americana.

O sistema financeiro global vive um processo de reconstrução. À medida que mais países desafiam o domínio do dólar americano no comércio internacional e buscam uma independência monetária cada vez maior, as alianças financeiras regionais surgem como alternativas viáveis aos modelos ocidentais.

Essa reorganização financeira reflete mais do que uma mudança na política econômica, ela reposiciona o eixo do poder monetário global, com impacto nas relações internacionais. Se os movimentos atuais se consolidarem, o sistema dolarizado poderá dar lugar a modelos mais descentralizados. 

A ascensão das alianças financeiras regionais

Uma das alianças globais que impulsiona essa mudança é o BRICS, que agora conta com dez membros (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Egito, Etiópia, Indonésia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos).

Fonte: Bloomberg

Por meio de iniciativas estratégicas que incluem as Moedas Digitais de Bancos Centrais (CBDCs), sistemas de pagamento baseados em blockchain e, possivelmente, a própria stablecoin do BRICS, o bloco tem demonstrado que essa cooperação pode criar alternativas viáveis à infraestrutura financeira existente.

Esse movimento levanta uma questão: o que a América Latina pode fazer para alcançar uma integração semelhante em seu próprio território? A região possui uma herança cultural compartilhada, extensas relações comerciais e economias complementares que, em tese, facilitariam a integração financeira. Por que, então, essa união ainda não aconteceu?

BRICS e o impulso por um ambiente financeiro comum

BRICS
BRICS e seus membros durante Reunião de Cúpula no Brasil. (Foto: Joédson Alves/ Agência Brasil)

O BRICS tem realizado movimentos estratégicos significativos para transformar a lógica das finanças internacionais por meio de ações coordenadas que impulsionam tanto a política monetária quanto as tecnologias financeiras. A abordagem fornece um modelo para a integração financeira regional que a América Latina poderia adaptar e aprimorar.

Integração blockchain para liquidação sem fronteiras

Os membros do BRICS desenvolvem sistemas financeiros baseados em blockchain para o comércio internacional como alternativa às estruturas dominantes. O SPFS (Sistema de Transferência de Mensagens Financeiras) da Rússia e o CIPS (Sistema de Pagamento Interbancário Transfronteiriço) da China representam soluções como alternativas ao SWIFT. 

A adoção da tecnologia blockchain nesses sistemas pode reduzir os tempos de liquidação de dias para minutos, além de reduzir significativamente os custos. No Brasil, as autoridades anunciaram para 2025 uma integração financeira avançada baseada em blockchain para a modernização do comércio BRICS, com o objetivo de melhorar as operações comerciais entre os países membros.

O BRICS trabalha na criação do  “BRICS Pay”, um sistema de pagamentos baseado em blockchain para facilitar o comércio entre os integrantes do bloco. De acordo com o Relatório Anual da Cúpula do BRICS, o principal objetivo é “criar e utilizar instrumentos de pagamento descentralizados, como o BRICS Pay, para fomentar o desenvolvimento do turismo, negócios e comércio internacional entre os países BRICS+”. A iniciativa pretende reduzir custos e acelerar transações internacionais, além de aumentar a segurança. 

Um sistema de pagamento compartilhado também é benéfico para aprofundar os laços econômicos entre as nações BRICS+ e reduzir a dependência dos sistemas financeiros ocidentais. BRICS Pay e criptomoedas podem oferecer às empresas alternativas descentralizadas (B2B, B2C, B2G, C2C, C2G, G2G) e garantir um comércio transfronteiriço mais suave, com maior resiliência econômica.

Desenvolvimento de CBDC e adoção de criptomoedas

Diversos integrantes do BRICS avançam com projetos na adoção de moedas digitais. O Brasil, por exemplo, lançou o programa piloto do real digital, no qual o Banco Central tem desenvolvido ações voltadas para a emissão da moeda soberana brasileira em formato digital.

A Rússia desenvolve o rublo digital, que apresentou resultados promissores em programas piloto para uso doméstico e internacional. O Yuan Digital da China (e-CNY) é a CBDC mais avançada do mundo, com mais de 260 milhões de usuários individuais (dados do PBOC do 1º trimestre de 2024) e integração em grandes plataformas de pagamento.

A rupia digital da Índia registrou um crescimento significativo na circulação de e-Rupees no varejo: saltou de 57 milhões para  2,34 bilhões de rúpias em um ano. O programa piloto visa um milhão de transações diárias e alcançou esse objetivo com vários bancos depositando salários e benefícios de funcionários em carteiras CBDC.

Nos Emirados Árabes Unidos, o lançamento do dirham digital está previsto para o último trimestre de 2025. O principal objetivo é “acelerar a transformação digital” dos serviços financeiros, ampliar a inclusão, promover a inovação, segurança e eficiência dos pagamentos, e alcançar uma sociedade sem dinheiro em espécie. O país também se posicionou como um centro de inovação para criptomoedas, atraindo empresas de blockchain e facilitando o financiamento do comércio baseado em cripto. 

Existem outros países do bloco que também têm trabalhado no desenvolvimento de suas próprias soluções, criando um novo ecossistema financeiro. Esses movimentos mostram que as nações do BRICS têm implementado ativamente inovações financeiras em escala internacional.

A oportunidade da LATAM para a integração financeira

Apesar de compartilhar laços culturais, linguísticos e históricos mais próximos, a América Latina ainda não aproveitou totalmente suas vantagens naturais para a integração financeira regional. Essa oportunidade se torna mais evidente quando comparada às conquistas dos países do BRICS, de continentes e sistemas econômicos muito diferentes.

Quais são as lacunas?

A América Latina carece de uma plataforma de pagamento unificada regionalmente. Embora países individuais tenham desenvolvido soluções de pagamento digital domésticas — o PIX do Brasil, o CoDi do México, o Transfiya da Colômbia — esses sistemas permanecem, em grande parte, incompatíveis entre as fronteiras. Essa fragmentação força o comércio regional a depender de relações de correspondência bancária denominadas em dólares americanos, o que eleva custos e reduz velocidade.

Por exemplo, se a infraestrutura da Transfero fosse adotada em toda a região, os pagamentos transfronteiriços poderiam se tornar mais acessíveis, rápidos e econômicos. Com o uso de stablecoins como BRZ e USDT, as transações seriam liquidadas em segundos, em qualquer dia e horário, sem depender de bancos correspondentes ou da rede SWIFT tradicional.

Em comparação com os métodos tradicionais, que muitas vezes levam de um a cinco dias com taxas que variam entre 3 e 6%, movimentações baseadas em blockchain da Transfero podem reduzir custos e permitir a liquidação em tempo real. Além disso, os usuários evitam múltiplos intermediários ou conversões de moeda, o que torna a solução ideal para empresas, profissionais autônomos e remessas diárias.

A fragmentação regulatória, no entanto, é um desafio significativo na região. Países latino-americanos operam com regras diferentes para finanças, combate à lavagem de dinheiro e criptomoedas, o que pode desacelerar a inovação e dificultar a oferta de serviços financeiros transfronteiriços. A Transfero conseguiu contornar esse problema através de experiência e estratégia adaptáveis.

BRZ aproxima negócios locais à Web 3.0

A empresa lançou a stablecoin BRZ, que é totalmente lastreada em moeda fiduciária brasileira (real brasileiro – R$) e segue as regras locais. Isso gera confiança tanto para usuários quanto para reguladores. Além disso, no segundo trimestre de 2025, a Transfero anunciou uma parceria com a Circle para integrar a Circle Payments Network (CPN). Isso ajuda a conectar os mercados latino-americanos com o resto do mundo de forma segura e compatível.

Em vez de esperar por um conjunto único de regras em toda a região, a Transfero se concentra em trabalhar com parceiros locais em cada país que já são licenciados e estão em conformidade. O sistema permite que as pessoas façam pagamentos domésticos, convertam para stablecoins e enviem dinheiro através das fronteiras sem usar o SWIFT ou pagar taxas altas.

O que é necessário daqui para frente é ampliar a cooperação entre governos e empresas para criar padrões compartilhados, mesmo que uma regulamentação regional completa ainda esteja distante. A Transfero pode fornecer soluções reais para a inovação transfronteiriça, construindo as parcerias certas e respeitando as leis locais.

Ineficiências de pagamento transfronteiriço impactam a região com alguns dos custos de remessa mais altos do mundo. De acordo com dados do Banco Mundial, enviar dinheiro dentro da América Latina custa, em média, de 6 a 8% do valor total da transação, bem acima dos custos de menos de 2% para pagamentos digitais domésticos em países como Brasil e México.

Esses altos custos impactam desproporcionalmente, sobretudo pequenas empresas e trabalhadores migrantes que dependem de transferências internacionais de dinheiro. Nesse sentido, a solução da Transfero causa impactos significativos. A própria API desenvolvida pela empresa permite que parceiros conectem perfeitamente os mundos fiduciário e cripto.

O cliente inicia um pagamento com um provedor local em seu país, os fundos são convertidos em uma stablecoin, enviados para a Transfero, e a empresa lida com o pagamento no Brasil — ou vice-versa. Esse processo elimina as taxas SWIFT e evita os altos spreads de câmbio de moeda normalmente cobrados pelos bancos.

A dependência da região de redes de pagamento estrangeiras gera vulnerabilidades e ineficiências. Grandes transferências internacionais expõem empresas latino-americanas a regulamentações estrangeiras, riscos de sanções e custos de conversão de moeda. O cenário se agrava em períodos de tensões geopolíticas ou em transações com entidades sancionadas.

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  • 30 de Julho, 2025